quinta-feira, 22 de maio de 2008

A cor da saudade (Murilo Guimarães)

Uma saudade
púrpura
Lena, Zé, vó Isabelé
sábado, no largo
o cheiro de fruta,
a feira antecede a festa.

Uma puta triste e feia
uma babá de cheiroso neném
uma criança suja e seu cão
um fusca verde abacate
memória desencanta
um rasgo de sentimento.

Eu poderia ter curtido
melhor este momento
mas, pronto, aqui estou
tão de longe, e foi bom.

Esta morna sensação
quase um ardor
o cantar de minha irmã
a cadela Catita,
a balaustrada
uma trouxa da nossa roupa
sobre a abnegada Felícia.

A ladeira, o calor
o rio lá embaixo
eu cheiro a macaco
é hora de me banhar.

Assim, lúgubre
Dupiru, Detina
Maria, a doida
eu e Arlinda
minha mãe na loja
meu pai policia.

na venda, olor a cachaça
e a meninada espera
anoitecer para ver
televisão na praça.

Tão dentro,
a tarde assim
lúgubre, morna
e púrpura em mim.

Uma vida inteira para trás
um fio de ressentimento
eu poderia ter vivido
melhor este tempo,
mas pronto, já se foi,
cá estou e é só.

Sempre em mim
o cheiro, a feira
a mulher,
e o fusca.

2 comentários:

Dim Silveira disse...

Murilo,
Você colocou nestes versos o verdadeiro sentimento, o sentimento de alguém que tem amor ao seu povo, a sua cultura, enfim, a sua terra!!
Parabéns Murilo!!!
Um abraço de seu amigo DIM

Cássio Serafim disse...

Que lindo o poema do Murilo! Muito emocionante esse revisitar a sua cidade natal através da lembrança de acontecimentos e personagens quotidianos. Deixa o leitor com vontade de conhecer esse universo. Parabéns!